Clínica Veterinária de Mangualde
Dr.
Benigno José Rodrigues
Dra. Sandra
Oliveira
PARTE III - Zoonoses transmitidas
por insectos vectores
As doenças transmitidas por vectores constituem
actualmente uma séria preocupação. São transmitidas por ectoparasitas como carraças,
pulgas, mosquitos e flebótomos, e devido ao seu potencial zoonótico representam
uma ameaça global para a saúde humana.
A região
mediterrânica com o seu clima ameno promove condições propícias para o
desenvolvimento destes ectoparasitas o que leva a que Portugal seja endémico
para várias das doenças transmitidas por insectos vectores.
Estes parasitas têm uma diferente sazonalidade
consoante a sua biologia e ecologia. Por exemplo, no Sul da Europa é esperado
encontrar carraças nos cães durante todo o ano, enquanto que a actividade dos
flebótomos geralmente limita-se aos meses mais quentes (de Junho a Outubro).
Isto implica que os cães estão em risco
de infecção por Leishmania infantum
durante todo o verão, e por muitos agentes patogénicos transmitidos por
carraças durante todo o ano.
- LEISHMANIOSE CANINA
A Leishmaniose canina é uma zoonose de grande
importância e de impacto na saúde pública. Todos os anos registam-se em
Portugal entre 10 a 15 casos de Leishmaniose em Humanos, especialmente nas
pessoas imunocomprometidas e crianças.
A doença atinge todas as raças de cães, em todas as
idades, e com uma elevada taxa de morbilidade e mortalidade.
É muito frequente nos países da bacia Mediterrânica
e da América do Sul. Em Portugal, a doença é endémica em todo o território,
embora algumas áreas apresentem uma prevalência mais elevada que outras: Trás-os-Montes
e Alto Douro, Beiras, Ribatejo, Alentejo, região de Lisboa, Setúbal e o
Algarve. Qualquer deslocação com os animais de estimação para estas zonas
significa um risco acrescido de contágio.
É causada por um protozoário: a Leishmania infantum que parasita o
sistema imunitário do hospedeiro: o cão. O
ciclo de vida deste parasita só se completa na presença de um vector: o insecto
flebótomo.
O flebótomo
ao picar um animal doente servirá de veículo do parasita a outro animal ou ser humano sadio que vier a picar e assim
sucessivamente. Sem o insecto, não há o ciclo. Por isso, o mero contacto ou
proximidade física de um cão contaminado com um saudável ou com o homem, não
constitui perigo de contágio da doença.
A Leishmaniose é
uma doença grave, de curso lento, crónico, de difícil diagnóstico e tratamento
e de fácil transmissão. No cão os sinais clínicos são muito variáveis.
Geralmente surge apatia, perda de peso progressiva, lesões na pele, crescimento
exagerado das unhas e perda de apetite. Se não for tratada é fatal.
A prevenção no cão faz-se com a vacinação e o uso
de produtos repelentes como coleiras ou pipetas. Também deve-se evitar passeios
em zonas de rios, charcos ou de águas paradas ao amanhecer e ao entardecer que
é quando há uma grande proliferação do insecto.
Para evitar a
picada dos flebótomos deve tomar precauções como usar repelentes de insectos,
redes mosquiteiras, evitar andar de pele exposta ao anoitecer e amanhecer e
desinfectar as instalações.
- DIROFILARIOSE
A Dirofilariose, conhecida como “a doença do verme
do coração” é causada pelo parasita nemátodo: Dirofilaria.
Em Portugal, esta doença ocorre preferencialmente
nas regiões do Ribatejo, Alentejo, Algarve e a Ilha da Madeira.
A Dirofilária afecta principalmente cães mas também
pode afectar gatos e animais silvestres.
A transmissão ocorre através da picada de mosquitos
fêmea do género Culex, mas também Anopheles e Aedes, infectados com larvas de dirofilária (microfilárias).
Durante a picada o mosquito inocula na corrente sanguínea do cão as
microfilárias que seguem depois para as artérias pulmonares no coração onde
desenvolvem-se em filárias adultas.
Os sintomas normalmente surgem vários meses após o
animal ser infectado. São comuns as dificuldades respiratórias, tosse crónica,
intolerância ao exercício, perda de apetite, perda de peso e morte súbita.
Se a doença for diagnosticada atempadamente tem
cura, no entanto o tratamento é muito dispendioso e apresenta riscos para a
saúde do animal.
A prevenção pode ser feita com base em comprimidos
administrados ao cão todos os meses (que eliminam as microfilárias em
circulação) e com o uso de repelentes (pipetas) que previnem a picada do
mosquito. Se viajar com o seu animal para zonas endémicas de dirofilariose,
previne-se antes.
É considerada uma zoonose pois afecta o Homem,
embora isso ocorra muito raramente. O Homem infecta-se quando os mosquitos
vectores se alimentam dele de forma acidental. As larvas de dirofilária são
transmitidas ao sangue periférico e na maioria dos casos, não ultrapassam o
tecido subcutâneo, morrendo aí. Se a infecção progredir, a dirofilariose humana
manifesta-se de maneira diferente dos animais: provoca infiltrações nodulares
em vários órgãos como o fígado e pulmões.
- ZOONOSES TRASMITIDAS POR CARRAÇAS
Em todo o mundo as carraças são a segunda causa de
transmissão de doenças infecciosas, a seguir ao mosquito.
As carraças adultas fixam-se aos animais para se
alimentarem do seu sangue. Elas são bem visíveis à vista desarmada, sendo
vulgar verem-se em maior ou menor número fixadas à pele dos animais. Ao picarem
podem transmitir doenças infecciosas.
Normalmente os animais apanham carraças em zonas
com vegetação, arbustos ou plantas em geral como nos campos, parques e jardins
das cidades.
A doença comummente designada por “Febre da Carraça” abrange um conjunto
de patologias provocadas por diferentes agentes etiológicos, que têm em comum o
facto de serem transmitidas pela picada de carraças. Entre elas temos:
-
Babesiose,
- Doença
de Lyme,
-
Erliquiose,
-
Riquetsiose
Estas doenças afectam o cão, e ocasionalmente o
gato. São zoonoses mas não é o cão ou o gato que as transmitem ao Homem, é a
picada de carraças.
Nas zonas endémicas, acontece muito frequentemente
a co-infecção com Leishmania infantum.
Isto representa um desafio maior para o Médico Veterinário porque os animais com várias infecções podem apresentar sintomas clínicos
diferentes dos que são observados em animais infectados por um só agente
patogénico.
Manifestam-se por: febre, letargia, anorexia, dor e
inflamação articular, anemia, hemorragias e perda de peso. Os animais nem
sempre apresentam todos estes sinais, tornando difícil o diagnóstico. Também
não é raro os sintomas surgirem bastante tempo após a remoção das carraças.
Para prevenir é importante reduzir o número de
picadas de carraças.
O que posso fazer?
- Tenha cuidado nas saídas ao campo. Afaste-se dos
arbustos e use vestuário que cubra as pernas e braços.
-Retire o mais depressa possível as carraças
fixadas em si e nos animais. A transmissão de doenças é mais provável de
ocorrer se a fixação superar as 12-24 horas.
- Não deixe que o seu animal ande por zonas de arbustos
e vegetação alta.
- Desparasite o animal contra as carraças, durante
todo o ano, com produtos recomendados pelo Médico Veterinário. As alturas do
ano de maior preocupação são, em Portugal, de Março a Setembro. A prevenção
deve iniciar-se antes de começarem a surgir as primeiras carraças.
- BARTONELOSE FELINA - DOENÇA DA ARRANHADELA DO GATO
Esta doença que é mais comum no Outono e Inverno é
provocada pela bactéria Bartonella
henselae. Os gatos são o principal reservatório da bactéria, em especial os
que tem menos de 1 ano de idade e os gatos vadios.
As pulgas são os vectores responsáveis pela
transmissão da infecção aos gatos. A bactéria encontra-se na saliva ou fezes de
pulgas infectadas.
As pulgas dos gatos não são as mesmas que afectam
os cães. Da mesma forma, há diferentes espécies de Bartonella spp, em que umas infectam os gatos (Bartonelose felina)
e outras os cães (Bartonelose canina). A infecção nos cães e gatos dá-se por
intermédio da picada de pulgas. Das diferentes espécies que causam a
Bartonelose felina a Bartonella henselae
é que é responsável pela zoonose: Doença da arranhadela do gato.
O gato é infectado quando é picado pelas pulgas ou
contacta com as suas fezes ao lamber-se (aquando da limpeza da pelagem). A
bactéria depois segue para a corrente sanguínea alojando-se nos eritrócitos
afectando os órgãos. O gato torna-se então portador da bactéria.
A maioria dos gatos não apresenta sinais clínicos e
a doença (Bartonelose felina) é subclínica. Se tiverem sinais são subtis como
uma febre ligeira, apatia ou falta de apetite. Contudo nos gatos com o sistema
imunitário deficiente devido à SIDA ou leucemia felina os sintomas podem ser
mais graves e a doença ser fatal.
As pessoas não adquirem a infecção através da
picada da pulga. O Homem infecta-se quando é arranhado ou mordido por um felino
hospedeiro da bactéria. Os gatos podem ter fezes de pulga nas unhas e infectar
o Homem ao arranhá-lo. O Homem apresenta no local de inoculação vermilhão e
pequenas pápulas ou pústulas. Segue-se depois o aumento dos gânglios linfáticos
locais, mal-estar, dores de cabeça e febre. Contudo se a pessoa tiver o sistema
imunitário comprometido a infecção pode tornar-se sistémica e mais grave.
O diagnóstico da infecção no gato é complexo e nem
sempre 100% fiável. Os gatos infectados com sintomas devem ser tratados.
A prevenção passa por desparasitar o gato contra as
pulgas, ter cuidado no contacto com gatos doentes e evitar as arranhadelas. Se
acontecer, desinfectar imediatamente a zona arranhada.
Artigo escrito por Sandra Oliveira – médica veterinária (CP
4910)
Clínica Veterinária de
Mangualde
Av. General Humberto Delgado Nº 12 R/C Esq.
3530-115 Mangualde
Telef.: 232.623.689